terça-feira, 29 de março de 2011

O socialismo dos repolhos

No início dos anos 80, começo de minha militãncia, lembro de uma  história que era contada por militantes que tinham alguma intimidade com alguns ex-presos políticos, recém-libertos. Lenda ou fato, dizia-se que depois das torturas, interrogatórios, etc., quando a privação de liberdade tornou-se realidade, certo grupo de presos tentou se organizar. Como deveriam conviver por tempo indeterminado nos mesmos locais, a divisão de tarefas foi a primeira providência. Discutiam marxismo, leninismo, alguns poucos trotskistas tinham também tempo para falar de suas teorias. enfim, discussões políticas, saudades de quem ficara fora, incerteza quanto a companheiros de quem não ouviam mais falar.
Com o compromisso de dividir tudo. Afinal, estavam todos eles presos por uma luta comum: Pela liberdade, o fim da ditadura e o socialismo.
Tudo funcionou muito bem até que começaram as visitas. 
Oriundos de diferentes classes sociais, quem tinha recursos subornava a corrupta polícia e providenciava a entrada de produtos proibidos. Cigarros. Livros. Até o dia em que passou, reza a lenda, um litro de uísque, dos importados, sei lá quantos anos.
Dizem que neste dia a garrafa foi "guardada" e não mais vista. Mas o arroz, outros legumes e algumas bolachas foram divididas entre todos.
Passou-se pouco tempo quando os ventos da abertura  chegaram a estes companheiros. Valorosos companheiros, muitos deles deram parte de suas vidas, saúde e sanidade  pelo fim da ditadura.
Certamente não darei as minimas pistas sobre personagens envolvidos neste fato ou lenda. Se fato, muito divulgado. Se lenda, tantas vezes contada que quase virou verdade.
Mas tenho lembrado desta história ultimamente quando leio sobre alta de juros, política constritiva, redução de investimentos. 
Porque o socialismo, ou ao menos a perspectiva de uma vida melhor, não pode ser para poucos.
Nós outros também queremos partilhar das riquezas que este país tem de sobra. Não dá para negar que a vida está melhor, infinitamente melhor do que nos tempos de FHC. 
Mas poderia ser de outra maneira.
Afinal, não queremos só o repolho.
Pense nisto, presidenta!

Nenhum comentário: