terça-feira, 18 de junho de 2013

O que eu não vi ontem

Protestar, opinar, lutar são direitos de todos nós, inclusive de quem, por opção ou coerção, desiste dele. Foi protestando que tremi de medo pixando "abaixo a ditadura", que chorei de tristeza quando a emenda Dante de Oliveira foi derrubada, de esperança nos comícios pró-Diretas Já! Chorei de raiva quando o sem-noção presidencial nos pediu para vestir verde e amarelo, e saí de preto dos pés à cabeça.
Protestei contra a venda da Vale, das privatizações, por um ano me concentrei na luta contra a ALCA. Chorei, bebi, fiz muita festa quando o dia nasceu feliz e Lula finalmente chegou lá. No poder? Não, no palácio. É bem diferente.
E apesar de bem diferente o tsunami varreu as economias de arrogante auto-proclamado primeiro mundo, enquanto a marola molhou nossos pés. Não sou economista para enumerar dados e gráficos, falo do que vivo.
De um Brasil que não resolveu a crise da maneira que eu, ambientalista gostaria: Ao contrário, incentivou produção e consumo, e se é verdade que nosso trânsito é um caos, o desemprego, que eu saiba, está entre os menores de nossa história. Um Brasil que não estatizou as universidades privada, mas onde pobre pode e estuda, e cursa universidade, mestrado, doutorado. Que tirou da linha da miserabilidade nem sei quantos milhões. Brasil onde assalariado pode comprar casa, autônomo tem conta em banco e crédito e não deve mais ao famigerado FMI. Que tem a inflação mantida sob rédea curta, e que cresce. As hidrelétricas? Também não me agradam. Mas me agrada menos a falta de energia. Existem alternativas eficientes.
Foi do jeito que sonhamos? Não. Tudo o que eu falei é verdade, mas também é verdade que o capital financeiro deita e rola, que a saúde é um desastre, que temos polícia&políticos corruptos. E ainda um homofóbico fascista admitido para tratar de direitos humanos.
O transporte público sempre foi um dos maiores desafios urbanos. Porque quanto menos poder aquisitivo, mais longe o trabalhador mora. Mais gasta, mais tempo emprega. E os empresários do setor, como bons capitalistas que são, tem a ladainha na ponta da língua: Querem isenções fiscais, reclamam dos "altos” salários, da manutenção. Propõem que o MEC banque a meia passagem para estudante e a previdência a isenção dos aposentados!
Tá certo o povo que foi para as ruas reclamar da tarifa. Tá certo quem pintou seu cartaz com “Eu quero uma saúde melhor”.
Mas não venham me ninar com a canção de movimento espontâneo. Como se fosse crível que, de repente, juntam-se pessoas e resolvem protestar pela passagem, alguém lembra saúde, outro corrupção e aí, lógico, da DIlma. Que parece ser a causa de todos os males do país. E quem não tinha nada para fazer aproveita o tempo livre para cobrir o rosto e depredar o que vier pela frente.
Os manifestantes que ocuparam as ruas ontem hoje ocuparam redes sociais. Garantem que o grupo que consideram “infiltrados” não passa de 2%. Que as pessoas estão indignadas por tudo o de podre, miséria, corrupção, fome, desemprego, querem mais saúde (eu também), mais educação (eu também), mais dignidade (todos nós). Não vi as faixas pedindo reforma agrária, urbana, política.
Ontem, aqui em Porto Alegre, passei pela manifestação, observei por um tempo. Dizem que a juventude está farta dos partidos políticos? Errado, vi um razoável número de bandeiras.
O que eu NÃO vi foram faixas de ambientalistas pedindo usinas eólicas, mães pedindo mais creches, vítimas dos juros abusivos pedindo a baixa dos juros.  Não vi os índios que estão perdendo suas terras, nem as vítimas da violência urbana reclamando por mais segurança.
Por volta de meia noite, encontrei o primeiro manifesto em uma rede social. Adivinhem: A juventude do PSDB, dando todo apoio aos manifestantes. Depois, declarações de militantes da esquerda muito esquerda. E, claro, notícias tingidas com os tons da imprensa reacionária.

O que me preocupa, enfim, não são as lixeiras queimadas ou marginais infiltrados. Preocupa saber até onde esta massa indignada está servindo de ferramenta para a direita, indignada com os níveis de aprovação de Dilma. Preocupa o surgimento de um novo salvador (lembram Collor?) que livre o país das arruaças e ameaças. Dos comunistas, quem sabe. Que acabe com esta mistura de miseráveis e filhos de boas famílias nas universidades, e tudo volte, outra vez ao seu lugar.

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