domingo, 9 de janeiro de 2011

Crianças, adolescentes: Sempre os últimos.

Nunca, em nenhuma situação de disputas, fossem elas ideológicas ou mesmo eleitorais, deixei de ouvir a preocupação com crianças e adolescentes.      
Bandeiras como educação, creche, saúde específica para a área fazem parte de quaisquer discursos. Mesmo antes, na época em que crianças eram presas junto com adultos em celas comuns, mesmo no tempo em que o código de menores desconsiderava as causas sociais e creditava os atos infracionais a distúrbios de caráter e má índole, como se alguém (ah, Lombroso!) já nascesse criminoso, ainda assim propostas que pudessem aliviar o problema social de crianças e adolescentes incômodos eram sempre bem ouvidos.
Atrocidades à parte, a partir da Constituição Cidadã, as mudanças estavam ali, disponíveis, dependendo apenas da pressão e da vontade política.
Crianças e adolescentes seriam, desde a aprovação do ECA, a prioridade absoluta em todo o país. Num Brasil dos anos noventa, o neoliberalismo grassando e precarizando todas as relações de trabalho, isto quando havia trabalho, foi muito difícil sua implantação.
O Rio Grande do Sul foi pioneiro em separar medidas e propor novas formas de acolher e constituir uma ação mais humanizada para crianças e adolescentes. Instituições voltadas para autores de atos infracionais separados de crianças e adolescentes portadores de necessidades especiais, em situação de risco ou abandono. Difícil, complicado, trabalhoso, mas inevitável e fundamental.
Antes, oQuando localizadas, são encaminhadas para abrigos, s que se fazia com crianças e adolescentes no Brasil (nem falando em mundo...) era determinado por suas classes sociais. A infância, com esta percepção que a temos hoje, é coisa de pouco tempo atrás. Crianças no Brasil colônia eram trabalhadoras, exploradas na medida de sua capacidade física. Até hoje, o trabalho infantil tortura e deforma corpos e mentes de milhares de crianças aqui, no Brasil. A idéia arraigada de que a criança ociosa será ocupada por pensamentos e ações voltadas para a desordem ou o ato infracional são tão arraigadas que é comum ouvirmos a indignação de cidadãos ditos progressistas com a proibição do trabalho antes dos 16 anos. Em várias situações do programa Menor Aprendiz o que acontece realmente é uma jornada um pouco mais curta para trabalhos meramente braçais, que em nada acrescentam à qualificação profissional dos adolescentes, mas que significam uma razoável economia para patrões. 
Por exemplo, o que o menor aprendiz aparende empacontando e carregando ranchos em mercados? Lavando privadas em fábricas? Faxinando escritórios? Quem fiscaliza isto, com o exíguo quadro de fiscais do trabalho? 
Quem já não ouviu a louvação das virtudes do trabalho precoce e sua condição de impedir que "as más condutas" contaminem crianças e adolescentes?
Nossa herança colonial inclui e se recusa a desconstituir a exploração infantil, inclusive a sexual. Era comum, para senhores de escravos com filhos homens, presenteá-los com um "manequinho", negrinho novo e pequeno, que servia de brinquedo, saco de pancadas e iniciação sexual para meninos brancos. O estupro de pequenas negras ou índias ou brancas pobres por parte dos senhores e patrões. E certamente por isto é que homens "de bem" continuam utilizando-se da prestação de serviços sexuais de meninas e adolescentes. E enquanto isto, a responsabilidade desta exploração sexual é creditada à falta de educação, caráter e moral das pequenas vítimas  que tem sua infância e inocência perversamente roubadas.
Certo que o país melhorou, inconteste, demos um salto da miséria absoluta e da precarização do trabalho, alterou-se o acesso à universidade foram criados programas de inclusão e retorno ao estudo. Saltamos para outra sociedade, melhoraram as condições, a oferta de profissionalização e de trabalho aumentou consideravelmente.
Mas ainda não aprendemos a lidar com os inúmeros e pequenos trabalhadores do tráfico, que vêem ali uma possibilidade de ascenção financeira e profissional a curtíssimo prazo, tão breve quanto sua perspectiva de vida. Não temos o que oferecer para eles. Não temos leitos nem programas para enfrentar a política de extermínio da infância e da juventude pobre, geralmente negra e favelada, e somente quando o crack passa a ameaçar a classe média/alta é que são tomadas algumas poucas e paliativas medidas, na verdade apenas uma grande e inteligente campanha publiciária que não atinge nem migalhas de quem realmente corre a ameaça da droga.
Não sabemos ainda o que fazer com crianças que tornaram-se adolescentes dentro de instituições que hoje já não possuem idade legal para sua permanência, nem condições de sobreviver fora delas. 
Em pleno 2011 ainda temos crianças e adolescentes na casa grande e na senzala. E nem de perto, estamos sendo capazes de formular políticas que avancem na compreensão desta realidade. 
Por que sem avançarmos no abandono e no combate aos preconceitos e idéias arraigadas nestes 511 anos de dominação, crianças e adolescentes abandonados, levados ao ato infracional, abusadas e em risco continuarão sendo exatamente o que foram até hoje:
INVISÍVEIS.
Menos quando, em festas religiosas e datas comerciais, cidadãos respeitáveis e politicamente engajados aliviam-se com alguns presentinhos, sorrisos e afagos.
Crianças e adolescentes não são moeda de troca. Não são alívio para culpas ocidentais cristãs da burguesia entediada.
Crianças e adolescentes não são o futuro, elas estão aqui, no presente.
Crianças e adolescentes e o que será feito delas são, neste momento, o maior desafio do Rio Grande do Sul.
O que fazer, quem fará e como fará, neste momento, é o maior desafio daqueles que escolheram um governo de esquerda no Estado e esperam dele uma solução condizente.



Um comentário:

Igor de Fato disse...

Cara Regina

Compartilho contigo e teus leitores o texto que escrevi sobre essa idéia que nós prezamos tanto que é a ideia do Socialismo com a nossa cara. O texto está disponível no link abaixo, que pode ser copiado e colado na barra de endereços:

http://igordefato.blogspot.com/2011/01/socialismo-com-nossa-cara.html

Obrigado,

Igor Pereira
UJS/RS